Nayab foi raptada por um homem muçulmano, que a obrigou a declarar à Justiça que tem 19 anos e que se casou e se converteu ao islã por vontade própria, sob ameaça de matarem sua família.
Nayab Gill foi sequestrada e casada à força no Paquistão em maio de 2021. (Foto: Morning Star News). |
Um pai cristão, Shahid Gill, chorou ao relembrar que neste domingo (20) completa um mês do dia em que um tribunal no Paquistão entregou sua filha de 13 anos à cústodia de um homem muçulmano, de 30 anos. No dia 20 de maio deste ano, Saddam Hayat e outras seis pessoas raptaram a menina Nayab e a forçaram a se casar com Hayat e a se converter ao islã.
Shahid Gill, um cristão católico, trabalha como alfaiate na cidade de Gujranwala. Sua filha Nayab estava estudando no sétimo ano e trabalhava como ajudante no salão de beleza de Saddam Hayat.
Gill relatou que Hayat se ofereceu para treinar sua filha no seu salão de beleza, enquanto a menina estava sem aulas, devido ao fechamento da escola durante a pandemia da Covid-19.
“Hayat me disse que, em vez de perder tempo, Nayab deveria aprender habilidades de salão para ajudá-la a sustentar a família financeiramente. Ele até se ofereceu para buscá-la em casa e deixá-la depois do trabalho, garantindo-nos que ela era exatamente como a filha dele”, disse Gill ao Morning Star News.
De acordo com Gill, o muçulmano prometeu pagar 10.000 rúpias (64 dólares) por mês para Nayab, mas após alguns meses, parou de pagar.
Quando a menina cristã desapareceu na manhã do dia 20 de maio, Gill e sua esposa Samreen foram à casa de Hayat perguntar se ele sabia do paradeiro dela, porém a família do homem disse que ele não estava em casa. Mais tarde, Hayat contatou os pais e afirmou que não sabia onde estava Nayab.
“Ele então se ofereceu para nos ajudar a encontrá-la e também nos acompanhou a vários lugares para procurá-la”, contou Gill.
Hayat acompanhou a mãe até a delegacia para registrar o desaparecimento de Nayab, o homem orientou que Samreen não relatasse que Nayab trabalhava para ele no salão de beleza.
“Minha esposa, sem saber, confiou nele e fez o que ele disse a ela para escrever no formulário”, disse Gill.
Justiça que legaliza estupro infantil
Faiz Mohammed, de 40 anos, e Ghulam Haider, de 11 anos, em sua casa em vilarejo rural no Afeganistão. (Foto: Stephanie Sinclair).
No dia 26 de maio, a polícia informou aos pais que Nayab estava num abrigo para mulheres desde o dia 21 de maio. “Em seu requerimento apresentado a um tribunal de magistrados no mesmo dia [21 de maio], Nayab alegou que tinha se convertido voluntariamente ao Islã há um mês e que sua vida estava em risco por causa de sua família cristã”, disse Gill.
No requerimento do dia 21 de maio, a garota afirmou que era uma mulher adulta solteira de 19 anos, porém sua certidão de casamento islâmica foi registrada no dia 20 de maio. Segundo o pai de Nayab, o juiz ignorou essas informações conflitantes e outras evidências.
A família foi ao abrigo ver Nayab no dia 26 de maio e ela disse à avó que queria voltar para casa e que estava disposta a declarar seu desejo num requerimento ao tribunal.
“Estávamos esperando do lado de fora do local, quando uma guarda nos disse que o pedido de Nayab teria que ser verificado pelo superintendente do abrigo, então teríamos que esperar algum tempo”, disse Gill.
Nesse meio tempo, um guarda do abrigo relatou à família que, na realidade, Nayab já havia escrito o requerimento solicitando que queria voltar para casa, mas que o superintendente tinha lhe forçado a falar com Hayat e outra pessoa ao telefone antes que ela tivesse a chance de assinar o documento.
“O superintendente então saiu furtivamente pelo portão dos fundos e foi até a polícia e disse a eles que havíamos sitiado a casa-abrigo e que eles deveriam nos remover de lá. Enquanto isso, Hayat também chegou lá e nos ameaçou de abrir fogo contra nós se não saíssemos do local em cinco minutos. Nós nos recusamos a ceder um centímetro, mas então a polícia chegou e nos disse para irmos ao tribunal no dia seguinte para a audiência”, denunciou Gill.
Então, no dia seguinte (27), no tribunal, Nayab reiterou que era uma mulher adulta de 19 anos e havia se tornado muçulmana por vontade própria.
“Nosso advogado não compareceu à audiência, então minha esposa e eu abordamos diretamente o juiz e apresentamos todos os documentos oficiais para provar que minha filha nasceu em 16 de outubro de 2007, o que a torna com 13 anos e sete meses. Dissemos ao juiz que ela estava mentindo sobre sua idade sob coação. Ela tinha hematomas no rosto e os olhos também estavam vermelhos, o que deveria ter chamado a atenção do juiz, mas ele ignorou”, afirmou Gill.
O juiz rejeitou os documentos oficiais que comprovam a idade real de Nayab, além da certidão de casamento de seus pais, que mostravam que eles tinham 18 anos de casamento, logo, não seria possível que sua filha tivesse 19 anos, conforme sua suporta certidão de casamento islâmico dizia.
Gill afirmou que o juiz não solicitou um exame de ossificação para verificar a idade verdadeira da filha, em vez disso, somente confiou na declaração de Nayab, feita claramente sob ameaça.
“O juiz aceitou o pedido de Nayab para deixar o abrigo e ficar com a família de Hayat. E não havia nada que pudéssemos fazer para impedi-la”, lamentou Gill. “Minha mãe desmaiou na sala do tribunal assim que o juiz deu sua ordem e, enquanto estávamos cuidando dela, a polícia discretamente levou Nayab para longe”.
Meninas cristãs violadas
Cena do filme “Dukhtar (Filha)”, que relata o casamento infantil no Paquistão. (Foto: Armughan Hassan).
O sequestro e o casamento forçado de meninas cristãs têm se tornado comuns no Paquistão. De acordo com a Portas Abertas, o Paquistão é o país com mais casos de casamentos forçados, com cerca de mil cristãos vítimas nos últimos dois anos.
As garotas cristãs raptadas por muçulmanos sofrem ameaças de que elas ou suas famílias serão mortas caso não declarem no tribunal que se converteram ao islã e se casaram por vontade própria.
No paquistão, relações sexuais com meninas com menos de 16 anos é considerado legalmente como estupro, porém, na maioria dos casos uma certidão de conversão falsificada e uma certidão de casamento islâmica influenciam a polícia a não imputar punição aos sequestradores.
Líderes de igrejas cristãs e ativistas de direitos humanos afirmam temer que a polícia, abrigos e a Justiça facilitem a conversão e o casamento forçado de meninas cristãs no país.
O bispo moderador da Igreja Protestante Unida do Paquistão, Azad Marshall, afirmou que entrou com pedido para a recuperação da menina Nayab no Tribunal Superior de Lahore e decidiu apresentar queixas contra policiais e oficiais de justiça por ignorar a legislação em relação a rapto e estupro no caso de Nayab.
“Infelizmente, nossa polícia e o judiciário inferior estão facilitando casamentos infantis e conversões de meninas de minorias, devido ao qual os perpetradores desse grave crime conseguem se safar”, denunciou o bispo Marshall ao Morning Star News.
Marshall também informou que pediu ao renomado advogado de direitos humanos Saif Ul Malook para entrar com um pedido ao Tribunal Superior para a recuperação de Nayab e abertura de uma nova investigação do caso.
“Estou bastante esperançoso de que o caso de Nayab chamará a atenção do judiciário superior e do governo para esta questão crucial mais uma vez, e um mecanismo seria desenvolvido para impedir tais atrocidades contra as meninas da minoria sob o manto da religião”, disse o bispo Marshall.
Assistência falsa de ONGs “cristãs”
Protesto contra o casamento infantil no Paquistão. (Foto: Asian News).
Kashif Nawab, um ativista de direitos humanos e diretor da Social Action Transformation of Humanity denuncia que ONGs não profissionais e denominadas “cristãs” estão contribuindo para que o problema dos casamentos forçados não seja solucionado.
“Há uma infinidade de grupos cristãos não profissionais no Paquistão que usam esses casos para obter doações estrangeiras sob o pretexto de fornecer assistência jurídica e financeira às famílias das vítimas. Depois de receberem o dinheiro, eles contratam advogados incompetentes que não apenas falham em apresentar os casos profissionalmente, mas muitas vezes nem aparecem nas audiências”.
Segundo Kashif, os casos de casamento forçado e acusações de blasfêmia são explorados por ONGs locais.
“Há uma infinidade de grupos cristãos não profissionais no Paquistão que usam esses casos para obter doações estrangeiras sob o pretexto de fornecer assistência jurídica e financeira às famílias das vítimas”, disse ele. “Depois de receberem o dinheiro, eles contratam advogados incompetentes que não apenas falham em apresentar os casos profissionalmente, mas muitas vezes nem aparecem nas audiências”.
No caso de Nayab, o pai da garota relatou ter sido enganado também por esses grupos.
“Muitas ONGs cristãs locais me asseguraram de fornecer assistência jurídica para a recuperação de nossa filha, mas elas simplesmente desapareceram depois de tirar fotos conosco”, disse ele, apelando às autoridades da igreja e do governo para ajudar a recuperar a filha.